Republicação seleta (e levemente aperfeiçoada) dos textos de eutenhoumblog.blogger.com.br, blog que mantive dos 16 aos 19 anos, de 2003 a 2006. A ideia é que a repostagem seja na mesma data anterior (dia e mês, apenas dez anos depois). Nos comentários, eu falo do que me lembro da época em que escrevi, e avanço. Pra que o meu eu de então fique contente.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Preconceito Artístico, sim, por favor, e com café

As ideias aqui em minha cabeça, às vezes são como disse Clarice Lispector, batem na testa e retornam. Ficam lá, caídas, com dores nos ombros e pernas cansadas, ideias arqueadas, sem vontade de fazer nada. Aí me aparece uma coisa ou outra em qualquer lugar, e os olhos veem e avisam o resto ("Irmão, olha só isso..."), movimentação em todas as células, e vem um neurônio e chuta a ideia pra fora. 

E ela sai, revigorada, para ser o que sempre foi, enfim. 

Para se compreender o que vou dizer, é preciso ter tido na boca, pelo menos por um instante, o gosto da Arte. Arte tem gosto sim, claro que tem. De café: quente, revigorante, único — e suja os dentes. Vai, é parte importante, o negócio suja os dentes. Arte suja os dentes. 

E o que eu vejo são pessoas que exibem seu trabalho como se comessem, digo, vendessem um pão. Eu acredito, vai saber por quê, que algo que você cria, cria porque faz parte de você. Seus personagens, seus versos, suas palavras: eles são mais unidos a você do que o tecido epitelial. As pessoas não arrancam seus olhos e põe em leilão, não vendem suas lembranças por pães (ainda). 

"É algo que corre pelo sangue", me disseram uma vez, e é verdade; não entendo como alguém pode aceitar ter uma parte de si analisada, embalada e colocada a venda, ao lado dos sucrilhos.
  
Exemplos tupiniquins? Claro, e com café: Charlie Brown Jr. e tantas outras que incessantemente tocam sempre as mesmas três músicas de trabalho, e que amargariam (como amargaram num programa da Globo que não vou citar) o silêncio dos fãs se tentassem tocar uma música dos primeiros álbuns. 

Eu sei como é estar em um palco e sentir como um jukebox qualquer, tocando aquilo que querem que você toque. 

Arte, definitivamente, não é feita para quem se sujeita ao resto do mundo. É o mundo que se sujeita.

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